sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Seção Carlsen ESPECIAL

Na véspera do esperado match pelo título mundial de xadrez, replicamos hoje, na Seção Carlsen, uma matéria especial do Jornal Xadrez Diário, que vem apresentando nos últimos dias uma série dedicada ao encontro Anand x Carlsen. A edição deste dia 08/11 é totalmente dedicada ao desafiante Magnus Carlsen, trazendo um minucioso histórico da evolução do gênio norueguês, número 1 do mundo. A reprodução aqui sofreu ligeira adaptação de nossa parte, a fim de contornar o viés castelhano do texto e facilitar uma melhor compreensão dos leitores. Os interessados em conhecer mais detalhes e opções de assinatura dessa importante publicação nacional, que tem como responsáveis o GM Darcy Lima e o MI Luís Rodi, pode consultar o site www.jornaldiarioxadrez.blogspot.com. Eis a reprodução da matéria, devidamente autorizada:

Uma nova febre do xadrez

O Ocidente não tinha experimentado tanta atenção pelo xadrez desde a época do match entre o estadunidense Robert Fischer contra o soviético Boris Spassky, lá por 1972. A aparição no cenário mundial de Magnus Carlsen (Tønsberg, Noruega, 1990) provocou uma nova onda de popularidade do milenário jogo, sobretudo quando conquistou o maior rating Elo da história, acima do próprio Fischer e até de Kasparov.

Magnus aprendeu jogar xadrez aos cinco anos, participando aos oito do seu primeiro torneio – um nacional de categorias-. Os mestres noruegueses tiveram viram nele interesse e talento, e logo o grande mestre Simen Agdestein e o mestre internacional Torbjørn Ringdal Hansen lhe deram aulas. Em 2003, Carlsen já tinha obtido o título de mestre internacional, e em 2004 o de grande mestre.

Anos de crescimento

Nesse mesmo 2004 aconteceu a primeira experiência de Carlsen no ciclo do campeonato mundial. O jovem norueguês foi eliminado por Aronian, na primeira rodada do torneio (em Tripoli, na Líbia), organizado pelo sistema de matches eliminatórios. «No seu primeiro ano como grande mestre, em 2004/05, os progressos pareciam lentos. Enquanto tentava de forma otimista e dura bater os grandes mestres adversários, Magnus ainda não tinha a necessária força de jogo e perdia muitas partidas e pontos de rating» (Henrik Carlsen).

Embora devagar, como indica o pai de Magnus, o progresso do jovem prodígio, entretanto, era incessante, e, para a Copa Mundial, realizada no ano 2005 na cidade siberiana de Khanty Mansiysk, se evidenciara pelos bons resultados: Azmaiparashvili, Amonatov e Cheparinov foram derrotados, e somente Bareev cortou a série de vitórias de Carlsen. Apesar de não lograr ingressar entre os oito melhores do torneio, posteriores vitórias ante Lautier e Malhakov classificaram Magnus para o seguinte torneio de candidatos – e com isso, se converteu no mais jovem candidato ao título mundial de todos os tempos.

No ano 2006, Carlsen venceu pela primeira vez o campeonato norueguês, após vencer Agdestein no match desempate, pelo placar 3x1. O título lhe tinha escapado nas duas edições prévias: em 2004, apesar de ter compartilhado o primeiro lugar com Østenstad, quando acabou perdendo a disputa, abaixo o critério, segundo o qual a melhor classificação no torneio anterior prevalecia; e em 2005, contra Agdestein.

Nesse tempo, seu jogo se consolidava e seu nome aparecia junto aos melhores do mundo em torneios clássicos como Wijk aan Zee. No ano 2007, o destino colocou ele novamente frente a Aronian (foto), pelo ciclo do campeonato do mundo, realizada em Elista, mediante matches eliminatórios. Um Carlsen mais maduro logrou empatar o duelo em seis jogos (+2 =2 -2), porém, depois de quatro jogos rápidos sem desequilíbrio do placar (+1 =2 -1), a maior experiência de Aronian deu frutos nos desempates no ritmo blitz. 

Na Copa Mundial, realizada no mesmo ano, em Khanty Mansiysk, Carlsen após vencer Adams e Cheparinov, acabou sendo eliminado nas semifinais por Gata Kamsky, que venceu a prova.

Jogo brilhante, porém sem lutar pelo título

O jogo de Carlsen tinha alcançado ema 2008 uma definitiva força que lhe colocava entre os Top Ten. Nesse ano, excelentes atuações em Wijk aan Zee (compartilhou o primeiro lugar com Aronian) e Linares (segundo, a meio ponto de Anand) confirmaram o seu nível. Foi nesse ano que Magnus teve o primeiro desentendimento com a FIDE. A entidade tinha organizado o ciclo de torneios Grand Prix (seis, no total), sendo o primeiro deles na capital do Azerbaijão, Baku. Carlsen realizou nessa oportunidade uma performance de 2800. No entanto, após acusar a FIDE de ter mudado as regras de forma radical, o norueguês desistiu de seguir participando do ciclo.

O ano de 2009 foi brilhante. Primeiro há que citar que Carlsen teve nesse tempo um forte treinamento com o ex-campeão mundial Gary Kasparov (os trabalhos começaram no mês de fevereiro, mas somente em setembro apareceram na imprensa). Os seus resultados, que já eram bons, ainda melhoraram:

  • performance de 2739 em Wijk aan Zee;
  • terceiro lugar em Linares;
  • segundo lugar, compartilhado com Topalov, no M-Tel Masters de Sófia;
  • primeiro lugar no Nanjing Pearl Spring (um Torneio de Categoria XXI da FIDE), com um dos vinte melhores desempenhos de todos os tempos e o melhor da história para um adolescente;
  • segundo lugar no memorial Tal de Moscou;
  • primeiro lugar no London Classic.


Essas atuações colocaram ele no topo do ranking Elo da FIDE, com 2810 pontos. Com base justamente no seu Elo, Carlsen classificou-se para o Torneio de Candidatos que determinaria o adversário do campeão mundial, Viswanathan Anand, em 2012. No entanto o mestre norueguês novamente rechaçou o convite, criticando o sistema empregado pela FIDE por não ser moderno nem justo. «Os privilégios do campeão, a extensão do ciclo, as mudanças que acontecem nesses ciclos, resultaram em um novo formato de candidatos que nenhum enxadrista teve que atravessar desde Kasparov, assim como o conceito de match após match incessante, que não é satisfatório em minha opinião» (Magnus Carlsen, citado por chessbase).

No mês de março de 2010, a parceria entre Carlsen e Kasparov chegou ao seu fim (há muitas versões acerca do motivo, mas o próprio Carlsen indicou que eles ainda estavam em contato e que oportunamente realizaria sessões de treino com o ex-campeão). Sem participar do desgastante – se bem que produtivo - ciclo do campeonato mundial, a atenção de Carlsen foi dedicada de forma exclusiva a uma série de grandes torneios, sendo seus resultados mais destacados dessa fase as vitórias no Memorial Tal (Moscou 2011 e 2012), no Grand Slam (Bilbao e São Paulo 2011 e 2012), em Bazna (2011), Biel (2011 e 2012) e no Londres Chess Classic (2012).

Nesse período ele perdeu duas vezes o número 1 do ranking Elo, mas desde julho de 2011 se mantém no primeiro lugar, tendo alcançado (em fevereiro de 2013) o recorde absoluto de 2872 pontos (na atualidade ele conta com somente dois pontos a menos).

Agora é a hora

Finalmente, a novidade mais esperada pelos seus torcedores teve lugar: Carlsen aceitou participar do ciclo de candidatos para definir o desafiante de 2013 do campeão mundial Anand (foto). O torneio, realizado em Londres, de dupla volta, entre oito participantes, teve um dramático desenvolvimento. Ao finalizar a primeira volta, Carlsen liderava, com meio ponto a mais que Levon Aronian. Porém, na segunda parte da prova, uma série de derrotas tirou as chances do mestre armênio, enquanto quatro vitórias deram ao ex-campeão mundial Vladimir Kramnik a possibilidade de alcançar Carlsen na liderança. Antes da última rodada, e com ambos os mestres mostrando a mesma quantidade de pontos, estava claro que, em se mantendo aquela situação, o sistema de desempate favoreceria a Carlsen. O mestre norueguês jogava de brancas ante Svidler, enquanto Kramnik jogava de pretas contra Ivanchuk. Necessitado da vitória, o mestre russo aplicou um original esquema da Pirc para enfrentar ao irregular mestre ucraniano, enquanto Carlsen ganhava uma microscópica vantagem em uma Ruy Lopez com d3 no seu jogo ante Svidler. No entanto, e para surpresa geral, tanto Carlsen quanto Kramnik perderam seus jogos, outorgando ao torneio uma grande dose de dramatismo e emoção. Finalmente, Carlsen se transformou no desafiante do campeão mundial Anand por ter mais vitórias que Kramnik no torneio. Na sua última apresentação antes do match com Anand, Carlsen venceu de forma clara a Sinquefield Cup, um quadrangular realizado na cidade de Saint Louis, Estados Unidos, onde obteve um ponto de vantagem sobre o segundo colocado, o estadunidense Hikaru Nakamura.

O estilo

"O jovem norueguês enfrenta o maior desafio de sua
história" (Xadrez Diário)
No começo, Magnus tinha um estilo agressivo, porém à medida que avançava, até se posicionar entre os melhores do mundo, foi adotando um approach mais universal, com tendência ao jogo posicional que faz ele se comparar com outros virtuosos desse estilo, como Capablanca, Fischer ou Karpov.

Para concluir, algumas considerações de notáveis enxadristas sobre o jogo de Carlsen:

«Ele é muito flexível, conhece todas as estruturas e pode jogar qualquer tipo de posição» (Viswanathan Anand).

«Carlsen tem a habilidade de avaliar corretamente qualquer posição, como unicamente Karpov podia fazer antes dele» (Gary Kasparov).

«Com a força combinada de suas habilidades e, não menos importante, a sua reputação, ele leva os adversários a cometer erros. Carlsen joga sempre de forma calma, metódica e sem medo; calcula de forma admirável, comete poucos erros e realiza um grande número de lances que são os melhores. Isto faz dele um monstro.» (Jonathan Speelman).

«É conhecido que ele não está interessado na preparação de aberturas; sua maior fortaleza é o meio jogo, onde ele manobra até superar a muitos dos seus adversários utilizando meios posicionais. O repertório de Carlsen tende a evitar possíveis crises durante os primeiros lances da partida, e invariavelmente promove situações de meio jogo que se prestam a um enfoque estratégico» (Jan Timman).

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