segunda-feira, 24 de junho de 2013

Seção 8 x 8 - GM Rafael Leitão

O blog Reino de Caíssa tem a honra de apresentar na Seção 8 x 8 de hoje uma entrevista com o atual número 1 do xadrez brasileiro, o GM maranhense Rafael Duailibe Leitão. Um dos maiores prodígios do nosso país, o pentacampeão brasileiro Rafael gentilmente aceitou o convite que lhe fizemos e premia os leitores do blog com uma reveladora entrevista sobre sua vida enxadrística, conselhos para se tornar um bom jogador, perspectivas do xadrez brasileiro, bem como sobre o match Anand x Carlsen. Obrigado, Rafael. Boa leitura a todos!


RC.1 – Como o xadrez entrou na sua vida e qual o papel de sua família para proporcionar a você uma trajetória de sucesso, rumo à maestria?

Rafael - Aprendi a jogar ensinado por meu pai, quando tinha 6 anos. Meus irmãos também jogam, portanto o xadrez sempre esteve presente em meu ambiente familiar. Meus pais sempre me apoiaram e fizeram o possível para que eu desenvolvesse meu jogo.

RC.2 – Na condição de melhor enxadrista brasileiro da atualidade e ídolo de uma legião de fãs, como é sua rotina diária de atividades relacionadas ao jogo?

Rafael - Tento conciliar minhas atividades como treinador e enxadrista profissional. Durante a semana dedico cerca de 8 horas diárias entre aulas e treinamento individual. Não dou aulas nem tenho uma rotina definida nos fins de semanas, mas a verdade é que o xadrez está presente até em meus momentos de lazer.

RC.3- Na sua longa e bem sucedida carreira enxadrística, existe alguma experiência em especial que tenha sido marcante na sua vida? Um torneio... Uma partida... Um adversário!

Rafael - Muitos são os momentos marcantes, seja pela alegria de uma conquista ou a dor de uma derrota. Destaco o Campeonato Mundial sub-18, que venci em 1996, na Espanha. Tanto pela importância do título, quanto por tudo que aconteceu durante o campeonato.

RC.4 – Como um jogador de grande experiência internacional, qual sua visão sobre o xadrez brasileiro na atualidade, em comparação com os principais centros do enxadrismo mundial, especificamente quanto ao nível de popularização do jogo? Podemos crescer mais, nesse aspecto?

Rafael - Estamos ainda muito distantes dos grandes centros do xadrez, seja em popularidade, seja em treinamento, nível técnico, quantidade de torneios ou condições para os profissionais. A verdade é que o xadrez ainda engatinha no Brasil. O destaque positivo é que, de uns anos pra cá, o nosso tem sido inserido dentro do ambiente escolar. Existe, portanto, a perspectiva de melhorar sua popularidade a longo prazo.

RC.5 – Ainda sob essa perspectiva, como você analisa o nível de profissionalismo das competições realizadas no nosso país? Sabemos fazer bons torneios? Há alguma sugestão do nosso melhor enxadrista para melhorarmos nesse aspecto?

Rafael - Infelizmente ainda contamos com poucas competições. É preciso fazer um agradecimento aos abnegados que se esforçam para que este número aumente. Quanto ao nível de profissionalismo das competições, ainda deixamos muito a desejar. Muitas vezes a organização (especialmente em torneios abertos) peca por não disponibilizar um salão de jogos adequado, um número mínimo de material disponível e outras condições indispensáveis para os participantes. Nesse sentido, considero a organização do Torneio Zonal 2.4, disputado recentemente em Manaus, um modelo. Excelente hotel, bom salão de jogos, material em todas as mesas. Como sugestão para os organizadores que tenham a ambição de fazer um torneio único e serem pioneiros, por que não adquirir os jogos dgt, que transmitem as partidas diretamente para a internet? Esse lado de transmissão online ainda é algo deficiente por aqui e um país com a importância do Brasil tem que ter organizadores e federações com um material tecnológico de ponta para esse tipo de transmissão.

RC.6 – Talento... Preparação... Juventude... É possível dizer em que medida tais fatores contribuem para o surgimento de um Grande Mestre? Nesse sentido, quais seus conselhos para a preparação de um jogador médio que almeje alcançar níveis mais avançados no xadrez de competição?

Rafael - É difícil mensurar a importância de cada um dos componentes que formam um bom enxadrista, mesmo porque isso difere muito em cada pessoa. Uma coisa é certa: é preciso estudar muito e ser um apaixonado por xadrez. Não adianta passar várias horas jogando na internet. É preciso estudar a teoria do jogo, fazer incontáveis exercícios de cálculo, estar disposto a passar horas e horas trabalhando. Muitos enxadristas jovens tem talento, mas não tem a energia para o trabalho necessário para ser um Grande Mestre. Um jogador médio, que queria melhorar seu nível, deve treinar todos os dias, especialmente a parte de cálculo, além de analisar detalhadamente suas partidas, montar um repertório, analisar a teoria. Enfim, é preciso ter vontade de "colocar a mão na massa"!

RC.7 – É possível projetar, num futuro não muito distante, um enxadrista brasileiro batendo na casa de 2700 de Elo FIDE? Poderá ser Rafael Leitão esse jogador? A propósito, que podemos esperar de sua atuação competitiva no futuro próximo?  Existe algum outro objetivo que você ainda espera atingir na sua vitoriosa carreira enxadrística?

Rafael - Para que um enxadrista brasileiro chegue a 2700, sem que isso seja fruto do acaso, antes precisamos melhorar as condições para o xadrez profissional em nosso país. Para chegar a 2700 é necessário um trabalho incansável e bons torneios. Se ele não conseguir se concentrar no treinamento porque não sabe como vai pagar as contas no fim do mês, como melhorar? Da mesma maneira, não adianta estar bem treinado e ter apenas abertos de fim de semana para jogar. Isso, de certa forma, responde à pergunta se posso chegar a 2700 em breve. Para ter chance de conseguir isso, eu teria que morar ou então passar longas temporadas na Europa, algo que não tenho disposição para fazer, por um grande número de motivos. Acredito que o Fier tenha chance de chegar a 2700 um dia, já que ele ama o xadrez e está sempre na Europa. Mas se chegará ou não... isso só o tempo dirá.

RC.8 – Numa crítica bem humorada, você já disse que, na disputa pelo título mundial deste ano, uma vitória de Anand frente à Carlsen seria uma zebra, tal qual o Brasil ser campeão mundial na próxima Copa! Convenhamos: jogando em casa e com o peso do nome, tanto o Brasil quanto Anand, podem vencer suas competições, sem que isso seja assim tão inesperado, não acha?

Rafael - Quando entramos na bem humorada seara dos "pitacos", tudo é possível! Continuo com o mesmo ponto de vista. Tanto o Anand quanto a seleção brasileira estão um nível abaixo no momento e podem ser considerados "azarões". E nome e torcida já não ganham jogos. Mas às vezes o esporte – felizmente – não respeita a lógica!

7 comentários:

  1. Parabéns ao Reino de Caíssa!
    Entrevista excelente com o mais completo enxadrista brasileiro.
    Rafael Leitão é um orgulho para o nordeste!!!
    Ele pode chegar aos 2700, sem muito apoio, assim como fez Leinier Dominguez que é o melhor da América Latina.

    Marcone Fiuza

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  2. Excelente entrevista, muito bem trabalhada as perguntas fugindo do trivial. Parabéns ao responsável. Saudações do amigo!
    Jornalista e Mestre FIDE
    Frederico Gazel

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  3. O RAFAEL LEITÃO JOGOU EM FORTALEZA RECENTEMENTE. GRANDE PESSOA !!!!!! PARABÉNS AO BLOG PELA ENTREVISTA.FAZER PERGUNTAS AO GM, TERIAMOS INÚMERAS PERGUNTAS....CONTUDO FOI BOM PARA NÃO CANSAR O GM !!!

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  4. Parabéns Fernando e parabéns GM Leitão muito boa a entrevista. Joguei contra o GM Rafael numa simultânea em SP, e estive recentemente com ele em Fortaleza, além de um grande jogador é uma pessoa muito educada e atenciosa com os fãs, nos sentimos muito orgulhosos de você grande Mestre Rafael Leitão!

    Joaquim Virgolino Fiho.

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  5. Parabéns !!! Ao blog Reino de Caíssa pelo belo trabalho.

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  6. Perguntas muito bem elaboradas e respostas excelentes. Destaco em especial a pergunta 4, que me toca hoje em dia e a pergunta 7 que me tocou no passado e à minha geração de enxadristas. Leitão, assim como Sunye, Milos, Lima, Vescovi, fizeram e fazem trabalhos pelo crescimento do xadrez brasileiro. Se não aumentar a quantidade de praticantes não teremos futuro. El Debs, Matsura e Fier também merecem crédito neste esforço.

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    1. Eu me esqueci de Krikor e suas excelentes análises de partidas.

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