sábado, 25 de dezembro de 2010

Crônica


O reencontro
Carlos Pessoa
Ia eu movimentando as pernas e as idéias, aqui na praia do Manaíra, ao lado do mar que me mostrava uma soberba visão panorâmica. Esta é a João Pessoa que eu adoro, confidenciei a mim mesmo. Mas, de repente, topo com ele, que vinha numa pressa que me encantou. Uma pressa de quem ia buscar o prêmio da loteria. Ora, ora, e haverá maior e melhor prêmio do que a saúde? Mesmo na pressa, ele parou e me deu aquele abraço. O mesmo sorriso, o mesmo humor, a mesma barba por fazer.
Era o cronista, o biógrafo de Balzac, o historiador, cuja simplicidade encanta, Nada daquele ar de quem sabe tudo, professoral, pedante. O nosso amigo não era outro: Fernando Melo, que há muito tempo saiu do espaço jornalístico, em que não só deleitava, como ensinava aos seus numerosos leitores. Um autêntico homem de letras, um mestre sem mestrado, que há muito deveria estar na nossa Academia, capaz de repetir aquela famosa frase de Sócrates: "o que sei é que nada sei". Fosse ele dizer isso em nossas modernas universidades e seria expulso...
O que mais me encanta em Fernando Melo é o humor. E quem tem humor, tem amor, e quem tem amor tem sabedoria e assim por diante. E para espanto de muitos, ele achou de escrever sobre um assunto de que não é especialista. Escreveu sobre próstrata, não na visão médica, mas de cronista, com o humor que o caracteriza.
Em uma das minhas andanças em Paris, fiz questão de visitar a Casa de Balzac. E me lembrei muito de Fernando... Como gostaria que ele fosse meu guia, naquele momento.
Fernando! Que encontro maravilhoso!... Quanto tempo não o via. E ele sorrindo: meu negócio, agora, é xadrez. Ah, como invejo aquele que conhece esse esporte da inteligênia! O único esporte que exige silêncio. Meu cronista só poderia ser uma grande enxadrista, nobre esporte da inteligência, que deveria ser ensinado em nossas escolas.
Lá se foi o meu cronista, em passadas largas, sem dúvida longe dos assuntos da próstrata. E me ficou na cabeça esta interrogação: por que os nosso jornais não abrem espaço a Fernando, o cronista, o conhecedor profundo de Balzac? Mas a vida é isto: um festival de encontros, reencontros e desencontros. Gostei de ter encontrado o cronista. E lá se foi ele, aumentando ainda mais os passos, e decerto lamentando tê-lo interceptado a caminhada salutar.
Lembrar que Fernando adora movimentar não só as pernas, mas, sobretudo, as idéias. Daí a paixão pela leitura. Daí o xadrez, daí o Cooper nosso de cada dia.
E viva o reencontro.
(Publicado originalmente no jornal Correio da Paraíba, em 13/12/2010)

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