“A
mão invisível do mercado” foi um termo cunhado pelo filósofo e economista Adam
Smith, lá pelos idos de 1759, e que hoje caracteriza determinada teoria
econômica. “A mão invisível da capivara” é uma hipótese parapsicológica,
levantada pelo ilustre capivara que vos escreve. Abordarei esse tema com maior
profundidade nas linhas que se seguem.
Estávamos
na 4ª rodada do XII Memorial Governador Miguel Arraes – Nordestão 2019, lá em
Recife (PE). Tinha sido emparceirado com o MF Francisco Cavalcanti, um dos mais
importantes jogadores da Paraíba. Salve, grande Chiquinho!
MF Francisco
Cavalcanti x Marcello Urquiza
Nordestão 2019 –
31/08/2019
1.Cf3 Cf6
2.d4 d5 3.c4
dxc4 4.Da6 c6
5.Dc4 Bg4 6.Ce5
Já
conhecia essa posição. Dias antes, eu tinha participado de um torneio de
rápidas em João Pessoa (PB). Na partida com Petrov Baltar, tive a seguinte
dúvida: se jogo Be6, vou atrapalhar o desenvolvimento
da ala do rei; com Bh5, eu temia que meu bispo ficasse fora do jogo. Depois de
alguma reflexão, resolvi tomar uma decisão salomônica. Nem e6 e nem h5. Iria
jogar Bf5!
Gostaria
de ter visto minha expressão quando Petrov fez 7.Df7 – xeque-mate! Tinha
acabado de levar um mate pastor!!
6....
Bh5 7.Cc3 e6
8.e4 Cbd7 9.Cd7
Dd7
Pensei
em jogar Cd7, mas, lhe confesso, não o fiz porque não gostei da estética da
posição. Pode isso? O certo é que, agora, minhas peças não estavam coordenadas
para apoiar a ruptura central.
10.f3 Be7
11.Be3 0-0 12.Be2
Tac8 13.0-0 b5
14.Dd3 Tfd8 15.Tfd1
Db7 16.Dc2 Cd7
Preparando
a ruptura. Posição que o cavalo deveria estar desde o 9º lance.
17.a3 Bg6
18.Db3 a6 19.Tac1
c5 20.dxc5
Se 20.
d5, as pretas jogariam c4, seguido de Cc5, com bom jogo. Depois de dxc5, a
posição está igualada.
20.... Cc5
21.Da2 Td1 22.Td1
Dc7 23.Tc1 Db8
24.b4 Cd7 25.Bf1
Bd6 26.g3 Ce5
27.Rg2 h5 28.Bf2
Cc4?!
Pura
insegurança. Quis liberar a diagonal para jogar h4. E por que não jogá-lo
imediatamente? Mestre Chiquinho, certamente, não iria fragilizar seu rei com
gxh4.
29.Cb1
Deixando
escapar a oportunidade de tomar a iniciativa do jogo com 29.Ca4!.
29....
Ce5 30.Tc8 Dc8
31.Dd2 Dc7 32.Cc3
h4 33.Be2 hxg3
34.hxg3 Dc6 35.Dd4
Cd7 36.Cd1 Be5 37.Da7
f5 38.exf5 Bf5
39.Ce3 Bg6 40.Cg4
Bb2 41.De3 Bf5
42.Dg5 Bg4 43.Dg4 Cf6
44.Dg6 Be5 45.Bc5
Bb2 46.Dd3 Dd5
47.De3 Rf7 48.Rf2
Da2??
Veja
bem, caro leitor, sob o olhar objetivo do Dr.Fritz, esse lance não compromete a
partida, desde que o peão não seja capturado e a dama retorne ao seu posto.
Então por que as duas interrogações? Porque a decisão de capturar já estava
tomada.
A
posição do diagrama lembra a política de dissuasão praticada durante a Guerra
Fria. EUA e URSS tinham, cada qual, um monte de bombas atômicas. Aí um dizia ao
outro: “se você jogar uma bomba em mim, eu jogo outra em você!”. E, assim,
vivemos por um tempo sob aquele frágil equilíbrio.
Mesma
situação nessa partida. As damas representam as bombas. Resolvi atacar um alvo insignificante, num
cantinho bem distante do território inimigo, com Da2.
“-É
assim? Então vou jogar uma bomba na capital do seu território!”
Caro
leitor, você há de concordar comigo. Salvo umas poucas imprecisões, eu tinha
feito um bom trabalho até esse momento. Tive a cautela de não capturar o peão
de “a3” nos lances 43 e 44. Temia me expor a um ataque. A posição estava
igualada, e a partida se encaminhando para um justo empate. Como explicar a
mudança no meu comportamento? Tenho uma hipótese, mas só a apresento depois.
49.Df4 Da3 (49.... Dd5=)
50.g4?
50.Dc7
seria decisivo. Algumas linhas:
a)
50.... Rg6 51.Dd6 Cd5 (Para qualquer outra resposta, as brancas
jogariam Bd3, com ataque só defensável mediante entrega de material)
52.De6 Cf6 53.Dd6, voltando a ameaçar Bd3, agora sem a
possibilidade de defesa através de Cd5.
b)
50.... Rg8 51.Dd8, seguido de Bd3.
Agora,
as pretas têm a chance de igualar novamente.
50.... Bc1
51.Dc7 Rg6 52.Bf8
-x-x-x-x-
Parem
o filme! Essa é a posição que vai
embasar minha hipótese!
Você já deve ter
percebido que as brancas ameaçam mate com Dg7. Dê mais uma olhada no diagrama.
Percebeu que Bd3 é também outra ameaça muito séria? A essa altura, eu já tinha
visto tudo isso. Então concluí que
necessitava manter minha dama em “a3”, para defender Bd3, e que, portanto, Bh6
era forçado.
Tanto
é que, nas conversas que mantive com Dr. Fritz, ele argumentou que, para Bh6, a
melhor resposta seria 53. De5, com igualdade.
Então,
convicto da necessidade de Bh6, joguei...
-x-x-x-x-
52....
De3+??
“Endoidou,
foi?”. Sei não. Mas sabia que, agora, a
dama tinha de fazer a defesa simultânea
dos 02 pontos ameaçados. Tarefa impossível.
Nas
análises “post-mortem”, Mestre Chiquinho argumentou que responderia a Bh6 com
g5. Vejamos o que aconteceria: 52.... - Bh6
53.g5 Bg5 54.Dg7
Rf5 e, apesar dessa preocupante
posição, o rei não está acessível às brancas. Paradoxalmente, o rei
branco é quem está mais exposto agora. As pretas têm acesso através de “e3” ou
“h4”.
Seguiu:
53.Rf1 Ch5
54.gxh5 Rh5 55.Dg7
Df4 56.Dh7 Pretas abandonam.
-x-x-x-x-
Ainda
nas discussões do “port-mortem”, quando fiz a defesa enfática de Bh6, Mestre
Chiquinho perguntou:
“ - E
por que não jogou?”
“ -
Sei lá. Alguma loucura.” Respondi.
Porém,
Dr. Fritz apresentou uma alternativa. E se 52.... Ce4+, ao invés de Bh6? As linhas abaixo são algumas das
possibilidades:
a)
53.fxe4 De3+ 54.Rf1 (Se 54.Re1 Dg1+)
54.... Dh3+ 55.Re1 Bh6 (Ameaçando Dh1 e Dc1. Note que o rei
preto não está acessível). 56.Dd6
Dc1+ 57.Rb3 Db1+, com possível empate.
b)
53.Rf1 Dc3 54.Dd7
Cg3+ 55.Rf2 De3+
56.Rg3 Dg1+ 57.Rh3
Dh1+, com empate.
É
possível que eu tenha vislumbrado essa alternativa e que, ao tentar executá-la,
tenha invertido a ordem dos lances? Se você é daqueles que buscam respostas
racionais a determinados fenômenos, então vai concordar: “-Sim. É possível que
você tenha intuitivamente percebido”.
Quanto
a mim, prefiro me garantir. Sabe-se lá se não foi aquela mãozinha, que citei no
primeiro parágrafo, quem me obrigou a jogar De3! Então...
Vade
retro, capivara!
Adorei a comparação com o a mão invisível do mercado! kkkkkk sensacional!
ResponderExcluirObrigado, Mestre Arthur.
ResponderExcluirMarcello